sábado, 8 de setembro de 2007

02.02 - Origem do Carnaval no Mundo e na Europa

Ao iniciar a pesquisa sobre a origem do carnaval, o pesquisador se depara com uma indagação: como terá surgido essa festa que hoje é comemorada em quase todas as partes do mundo?


É nas páginas do livro, “As festas populares na expansão do turismo, a experiência italiana”, de Maria Nazareth Ferreira, que descobrimos que o carnaval nasceu de antigos rituais romanos, cuja origem está na Saturnalia, uma celebração em homenagem a Saturno e que fora praticada desde o séc. V a.C., pois o templo de Saturno, existente em Roma, data de 497 a.C. A prática desta festa era reviver rituais antigos, e os dias de festas eram comemorados entre os dias 17 e 23 de dezembro, onde além destes dias, havia mais seis dias de feriados, quando a justiça então ficava proibida de prender, julgar ou executar prisioneiros.

“A parte sagrada da festa compreendia um conjunto de rituais celebrados no Templo di Saturno, seguido de um banquete sagrado, durante o qual se trocavam estatuetas de cera (sigilia), de grande significado ritualístico, além de outros presentes. Em cada comunidade elegia-se o Rex Saturnaliorum que, após o ritual sagrado, deveria organizar divertimentos, danças, jogos de azar e todas as atividades que eram rigorosamente proibidas durante todo o ano”. (página 28)

Como se percebe nestas linhas, o Rex Saturnaliorum, eleito em cada comunidade e que tinha o dever de organizar os divertimentos e as festas, seria o que hoje conhecemos como o Rei Momo, que tem a obrigação de participar e organizar todas as festas e bailes de carnaval, mas que ultimamente, tem sido apenas uma figura folclórica com um poder fictício.
Além disso, os dados contidos no livro informam também que,

“Durante as festividades das Saturnalia as relações sociais eram subvertidas: os escravos zombavam dos senhores e eram por estes servidos; os homens livres exerciam funções próprias da aristocracia, reatualizando assim o tempo mítico da origem – a áurea aestas”. (página 28).

Com este detalhe podemos compreender porque que no carnaval as pessoas invertem os fatores e as classes sociais, como nas fantasias em que escravos se fantasiam de reis e rainhas, e os senhores e autoridades são caricaturizados por pessoas do povo que não detinham poder nenhum como forma de protestar e manifestar os seus desejos de alcance da pirâmide social, e também quando os homens se vestem de mulher, e as mulheres se fantasiam de homens.
Ainda nas páginas do livro, é necessário destacar que Saturno possuía uma forte ligação com a terra e a agricultura, e quando os reis de Roma, Numa Pompílio e Sérvio Túlio, reformaram a religião romana juntaram em uma mesma época todas as cerimônias e rituais dedicados a terra e que eram celebradas no solstício de inverno, que na Europa ocorria entre os dias 17 a 25 de dezembro, dependendo do ciclo solar de cada ano, e cuja festa das Saturnalia, também era considerada como uma festa de expiação.
E é através destas linhas que compreendemos certas modificações que foram realizadas através dos tempos, quando a Igreja assume e continua a controlar os festejos como vimos até hoje, nos carnavais cariocas, onde escolas de samba são proibidas de mostrar determinadas alegorias, de caráter religioso.

“As Saturnalia eram rituais sagrados, os quais eram impregnados da experiência cotidiana dos antigos romanos. Sua transmutação em festa carnavalesca, nos primeiros tempos, está apenas no nome, pois continuou sendo praticada da mesma forma. O carnaval pré-cristão acompanhava com os seus rituais a passagem do Ano Velho para o Ano Novo. Era uma festa de confraternização, de bom augúrio para as colheitas e para o Ano Novo que se iniciava. Era considerado por Catulo a época dos mais belos dias do ano, a época de acender as candelas de cera para aquecer simbolicamente o sol, que começava a se esfriar no céu.
Por outro lado, sua sedimentação na cotidianidade dos povos antigos era tão forte que, quando se formou a fé cristã, a nova Igreja acabou por assumir o seu controle, enquadrando-o no seu calendário litúrgico, antecedendo à Quaresma, que passou a funcionar como penitência. Nos primeiros tempos, o carnaval começava em 26 de dezembro, mas a Igreja transferiu seu início, segundo cada local para de 6 a 17 de janeiro. Para instrumentalizar a forte presença da idéia de purificação presente na população desde tempos imemoriais, a Igreja mudou o Carnaval e a Quaresma para o mês de fevereiro. Nos tempos antigos o mês de fevereiro era exclusivamente dedicado aos rituais de purificação, como o indica o seu próprio nome: februari (significa ação de purificar). No calendário antigo, era o último mês da purificação, e assim permaneceu depois da reforma de Numa Pompilio”.

Este livro conta também que apesar dos carnavais mais faustosos terem ocorrido nos sécs. XVIII e XIX, quando assumiu proporções monumentais, há notícias de carnavais suntuosos desde o séc. XII. Maria Nazareth conta também que a primeira notícia sobre o carnaval romano data de 1141 a 1143 e era realizado no Testacio ao Monte dei Cocci, onde além das festas eram realizados jogos militares, corridas, lutas com animais e muita violência. Além do Testaccio, a festa chegava até a Piazza Navona, e o carnaval era organizado a partir da atual Via del Corso,

Via dei Corso, Itália.

... taí portanto, a referência que existe até hoje, em alguns carnavais do século passado, onde os carros eram enfeitados e desfilavam pelas ruas da cidade e eram chamados de “corsos”.

Vale destacar também que o maior reformador do carnaval foi o Papa Paulo II (1464-1492) que é considerado como o fundador do carnaval moderno, e foi justamente ele quem transformou o carnaval em ato político. Depois dele, outros Papas também tiveram participação na estruturação do carnaval, como por exemplo: o Papa Inocêncio VIII, que deu grande impulso aos jogos carnavalescos e, Alessandro VI (Borgia) (1492-1503), que autorizou o uso de máscaras nas igrejas.

Papa Giulio II

Entretanto foi com o Papa Giulio II (1503-1555) que o carnaval assumiu a condição artística e os autores dos primeiros carros alegóricos foram Bramante, Raffaello, Michelangelo e Sangallo. Nos primeiros séculos da modernidade, os desfiles carnavalescos também contavam com as figuras dos gigantes mascarados (feitos de papel), cujas figuras baseavam-se nos mitos e divindades dos cultos antigos, e atualmente em alguns lugares do Brasil são caracterizados por homens, mulheres e animais,

Galo da Madrugada e Bacalhau do Batata.


... como o “Galo da Madrugada”, Recife, PE; “Bacalhau do Batata”, Olinda, PE; “Boneco Batoré”; “O Homem da Meia-Noite”, Olinda, PE; a “Boneca do Valdir”, São João da Barra, RJ; “Boneco do Bambu”; e o “Pega Veado”, Campos, RJ, etc.
Um fato que caracteriza o poder da Igreja sob a festa do carnaval e que vemos até hoje, quando a Igreja censura certos tipos de fantasias e carros alegóricos é que os primeiros carros alegóricos eram dedicados à celebração do Papado, por isso que até hoje, vemos a Igreja ostentando o seu poder diante de uma festa tida como pagã.
O único fio condutor das antigas Saturnalia com os carnavais de hoje está no mecanismo de inversão de valores das situações do cotidiano onde os poderosos são colocados na berlinda, como válvulas de escape das tensões nervosas do dia-a-dia e das humilhações sofridas pelos empregados, mas vale ressaltar que tais inversões na verdade foram financiadas pelos próprios patrões que consentiam nesses ritos.

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