sábado, 8 de setembro de 2007

02.01 - O carnaval como manifestação cultural e folclórica


José Marques de Melo

No livro “As festas populares como processos comunicacionais: Roteiro para o seu inventário, no Brasil, no limiar do século XXI”, o autor José Marques de Melo preceitua que “festa é um fenômeno de natureza sócio-cultural que permeia toda a sociedade; significando uma trégua no cotidiano rotineiro e na atividade produtiva”.


Alceu Maynard

No mesmo livro, há uma citação de Alceu Maynard Araújo, que identifica o surgimento da festa na gênese da sociabilidade do homem, atribuindo um sentido mágico e comunitário.

“Dentre as manifestações da vida social nos agrupamentos humanos podemos destacar a festa, cujo aparecimento data das mais remotas eras, certamente quando o homo faber, deixando de ser mero coletor de alimentos, praticante da técnica da subsistência da catança, passou a produzi-los, plantando. Há na aurora das festas aquela preocupação mágica de agradecer a natureza ou suplicar para que ela, entidades supraterrenas, não permitam as pragas, danos ou malefícios nas plantações, praticando, portanto ritos protetivos e produtivos. A festa interrelaciona-se não só com a produção, mas também com os meios de trabalho, exploração e distribuição, ela é portanto conseqüência das próprias forças produtivas da sociedade, por outro lado é uma poderosa força de coesão grupal, reforçadora de solidariedade vicinal cujas raízes estão no instinto biológico da ajuda, nos grupos familiares (Araújo, 1973:11)”.

O pesquisador José Marques de Melo informa que o estudo das festas não pode ser feito de forma estanque sem que façamos uma correlação das festas com a vida quotidiana, as suas rotinas e também com o mundo do trabalho. A festa faz parte do “lazer”, onde as classes populares ingressam de forma intensa quando passam a ter direito ao “ócio”, privilégio que era desfrutado apenas pelas classes mais abastadas da sociedade.
O fato é que, o carnaval por ser uma festa pagã também é tida pelo povo como uma “festa da desordem”, e José Marques de Melo, pontua com um trecho de Da Matta, esse fato:

“Penso que o carnaval é basicamente uma inversão do mundo. (...) Nele, conforme sabemos, trocamos a noite pelo dia, ou, o que é ainda mais inverossímil: fazemos uma noite em pleno dia, substituindo movimentos da rotina diária pela dança e pelas harmonias dos movimentos coletivos que desfilam num conjunto ritmado, como uma coletividade indestrutível e corporificada na música e no canto. (...) Carnaval, pois, é uma inversão porque é competição numa sociedade marcada pela hierarquia. É movimento numa sociedade que tem horror à mobilidade, sobretudo à mobilidade que permite trocar efetivamente de posição social. É exibição numa ordem social marcada pelo falso recato de “quem conhece o seu lugar” - algo sempre usado para o mais forte controlar o mais fraco em todas as situações (Da Matta, 1984: 74-78)”.

Ao fazer um balanço das festas brasileiras no final do século XX, Alceu Maynard Araújo argumentou que muitas tradições que aqui chegaram vindas na bagagem cultural dos colonizadores foram esquecidas pelo tempo.

“Muitas festas desapareceram, outras estão desaparecendo; entretanto das novas culturas, algumas estão voltando e não são apenas nas festas de produção como vinho, o trigo, a laranja, a maçã, etc., mas também aquelas que rememoram e existiam na terra de onde elas se originaram”.

As festas brasileiras apesar dessa renovação como espaço típico de lazer, preserva sua natureza diversificada e ao mesmo tempo permanece híbridamente fincada em suas raízes populares.

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